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Câmara aprova texto-base do novo arcabouço fiscal

24/05/2023 Compartilhar Twitter

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta terça-feira (23), por 372 votos a 108, o texto-base do projeto de lei complementar que trata do novo arcabouço fiscal (PLP 93/2023) – regra que substitui o teto de gastos.

Os parlamentares ainda precisam analisar destaques de bancada com sugestões de modificações ao texto votado. Até o momento foi votado apenas um dos destaques, de autoria da Federação PSOL-Rede, que pretendia retirar do texto o capítulo que tratava das vedações de gastos impostas ao governo federal em caso de descumprimento da meta fiscal (os chamados “gatilhos”).

O substitutivo, de autoria do relator, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA), traz modificações em relação à versão distribuída pelo relator na semana passada. No novo texto, deixou de constar dispositivo que garantia ao governo um crescimento das despesas públicas de 2,5% para 2024, descontada a inflação.

O patamar seria o máximo da banda de evolução de gastos previsto na regra (que vai de 0,6% a 2,5%) e havia sido visto como uma espécie de “colher de chá” concedida ao governo para inflar o Orçamento do ano que vem.

Em meio a criticas de parlamentares e agentes econômicos, Cajado trouxe para o novo texto uma solução de meio termo, buscando contemplar um espaço maior para despesas em relação ao que prevê a regra regular do marco fiscal, mas em proporção menor do que a indicada no primeiro substitutivo.

 

A nova versão prevê que, após a divulgação da segunda avaliação bimestral de receitas e despesas primárias em maio de 2024, caso a receita verificada indique superação das expectativas, o governo pode gerar créditos suplementares na razão de 70% da diferença em relação ao realizado no ano anterior para além do limite de despesa estabelecido.

Mas, caso ao final do período se verifique que a projeção de receitas se frustrou, será necessário descontar os valores na peça orçamentária do exercício seguinte e corrigir a base de cálculo pelo excedente não concretizado.

O texto, por outro lado, não trouxe mudanças em relação às exceções à regra que constavam da primeira versão do substitutivo apresentado na semana passada. Em comparação com o texto encaminhado pelo governo, foram incluídos no limite de despesas os gastos com capitalizações de empresas estatais, transferências relacionadas ao piso de enfermagem e repasses a título do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundeb).

Também entram na conta despesas da União relacionadas à organização e manutenção das polícias e do corpo de bombeiros do Distrito Federal, além de qualquer assistência financeira ao ente subnacional para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio.

O substitutivo de Cláudio Cajado, apesar das modificações, manteve a “espinha dorsal” da regra encaminhada pelo governo. O texto mantém a combinação de duas grandes regras fiscais: 1) meta anual de resultado primário; e 2) limite para despesas.

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estabeleceu como compromisso um déficit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2023, equilíbrio no ano seguinte e superávit de 0,5% e 1% em 2025 e 2026, respectivamente. Durante o período, o intervalo de tolerância estabelecido foi de 0,25 ponto percentual para cima ou para baixo.

O marco fiscal limita o crescimento anual dos gastos públicos a uma faixa de 0,6% a 2,5% acima da inflação. Pela proposta, as despesas crescerão a uma razão de 70% da evolução real das receitas no exercício anterior, desde que respeitando os limites mínimo e máximo da banda estabelecida.

Caso haja descumprimento do limite inferior da meta de resultado primário no exercício anterior, as despesas só poderão crescer a uma proporção de 50% das receitas no ano seguinte, respeitando o piso de 0,6% e o teto de 2,5%, descontada a inflação aferida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Buscando atender demandas das bancadas partidárias, o relator incluiu “gatilhos” que devem ser acionados pelo poder público em caso de descumprimento da meta de resultado primário estabelecida, retomou a necessidade de contingenciamentos previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) se for observada divergência em relação aos objetivos, trouxe parte dos parâmetros quantitativos da norma para o próprio texto e enxugou o número de exceções à norma.

Caso o resultado primário atingido pelo governo em um exercício seja inferior ao limite mínimo do intervalo de tolerância da meta, além da limitação para o crescimento real das despesas em 50% das receitas, ou 0,6% reais (o que for maior), o substitutivo do arcabouço fiscal obriga a aplicação imediata dos seguintes “gatilhos” para controlar a dinâmica dos gastos públicos:

No primeiro ano de descumprimento, aplicam-se as seguintes vedações já previstas na Constituição Federal:

1) Criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;

2) Alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

3) Criação ou majoração de auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e de militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivados de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior ao início da aplicação das medidas;

4) Concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária.

Caso o resultado abaixo do limite inferior da meta de primário ocorra pelo segundo exercício consecutivo, inclui-se a aplicação imediata, enquanto perdurar o descumprimento, das demais vedações previstas no art. 167-A da Constituição Federal:

5) Concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de membros de Poder ou de órgão, de servidores e empregados públicos e de militares, exceto dos derivados de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior ao início da aplicação das medidas;

6) Admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, ressalvadas: a) as reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa; b) as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios; c) as contratações temporárias, exceto em casos de necessidade temporária de excepcional interesse público; d) as reposições de temporários para prestação de serviço militar e de alunos de órgãos de formação de militares;

 
7) Realização de concurso público, exceto para as reposições de vacâncias;

8) Criação de despesa obrigatória;

9) Adoção de medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação, observada a preservação do poder aquisitivo; e

10) Criação ou expansão de programas e linhas de financiamento, bem como remissão, renegociação ou refinanciamento de dívidas que impliquem ampliação das despesas com subsídios e subvenções.

Mas o relatório também abre a possibilidade de, nesses casos, o presidente da República enviar mensagem ao Congresso Nacional, acompanhada de projeto de lei complementar que proponha suspensão parcial ou a gradação das vedações previstas, demonstrando que o impacto e a duração das medidas adotadas serão suficientes para compensar a diferença havida entre o resultado primário apurado e o limite inferior do intervalo de tolerância da meta indicada.

Ficam de fora de quaisquer mecanismos de controle as despesas referentes ao reajuste do salário mínimo decorrentes das diretrizes instituídas em lei de valorização, cujo projeto ainda está em tramitação no Poder Legislativo. Tal flexibilização “amarra” quase 1/3 do Orçamento, dificultando a margem para ajustes por parte do governo federal. As vedações também não se aplicam em situações de calamidade pública em nível nacional.

O substitutivo determina, ainda, que o nível mínimo de despesas discricionárias necessárias ao funcionamento regular da administração pública não poderá ser fixado em limite inferior a 75% do valor autorizado na respectiva lei orçamentária.

Pela regra, a programação destinada a investimentos públicos incluída no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) não será inferior ao montante equivalente a 0,6% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado no respectivo período.

Neste caso, são referidos os investimentos propriamente ditos e inversões financeiras, quando a despesa se destinar a programas habitacionais que incluam em seus objetivos a provisão subsidiada ou financiada de unidades habitacionais novas ou usadas em áreas urbanas ou rurais.

Também consta do substitutivo dispositivo que prevê que, caso o resultado primário exceda o limite superior do intervalo de tolerância da meta estabelecida, o governo federal poderá ampliar as despesas.

Neste caso, no entanto, o relator fixou um teto de 70% para este aumento, que pode ser direcionado a investimentos, prioritariamente para obras inacabadas ou em andamento, e para inversões financeiras. Desde que não haja apuração de déficit primário no referido exercício.

 

Na proposta original, havia apenas um limite para o “bônus” de investimentos fixado em R$ 25 bilhões anuais entre 2025 e 2028, correspondente a pouco mais de 1/3 do Orçamento reservado para essa rubrica em 2023 (R$ 71 bilhões).

E os aumentos de despesas em razão da superação da meta não entram na contabilização do valor mínimo de gastos para os anos subsequentes.

O substitutivo também determina que a ampliação das dotações orçamentárias não poderá ultrapassar, em qualquer hipótese, o montante de até 0,25 p.p. do PIB do exercício anterior ao da elaboração da LOA (o que hoje gira próximo de R$ 25 bilhões).

Debate em Plenário
Na fase de discussão em Plenário, deputados demonstraram preocupação com a manutenção de políticas públicas após a aprovação do arcabouço fiscal. Integrantes da base, no entanto, destacaram a importância do mecanismo para o equilíbrio das contas públicas e dispositivos no texto que preservariam programas fundamentais de governo.

O deputado Alencar Santana (PT-SP), que é vice-líder do governo na casa legislativa, destacou o compromisso com o aumento real do salário mínimo e com o Bolsa Família, que não estavam garantidos sob o regime do teto de gastos.

“É um novo marco fiscal e social, porque garante políticas públicas fundamentais para o nosso país. Temos a garantia de que o Fundeb não terá diminuição e temos a garantia de investimento mínimo”, disse.

O deputado Odair Cunha (PT-MG) afirmou que o texto de Cajado é o equilíbrio entre as diferentes opiniões da Casa. “Não podemos, em busca de um texto que seja ótimo, cair no péssimo, que é o teto de gastos”, afirmou. Ele disse que a proposta garante estabilidade econômica, previsibilidade e credibilidade.

Já o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) destacou que a estratégia da regra fiscal é a de um Estado que terá mais participação na economia com as políticas públicas. “Entendendo que a despesa vai crescer, como podemos disciplinar essa despesa? Criando certo gatilhos, com a redução das exclusões e dando limites”, destacou. Ele afirmou que a proposta vai permitir a realização de políticas para redução de pobreza.

Fundeb
Muitos deputados, por outro lado, destacaram preocupação com a inclusão do Fundeb nos limites da meta. A complementação do governo federal ao fundo seria limitada ao cumprimento da meta.

 
 

Para o deputado Chico Alencar (Psol-RJ), trata-se de um novo regime para diminuir os investimentos. “É um regime de emagrecimento das políticas públicas. Limitar de 0,6% a 2,5% de gastos não é teto?”, questionou. Para ele, ainda que o Fundeb não tenha perdas, os recursos serão retirados de outras políticas públicas.

A deputada Tabata Amaral (PSB-SP) também criticou a inclusão do Fundeb na meta. “Colocar o Fundeb dentro do teto é transformar a educação, que deveria ser prioridade, no exato oposto”, disse. Ela defende que a complementação da União ao fundo seja incluída nas exceções da proposta.

Teto de gastos
Para alguns deputados o ideal é o modelo do teto de gastos. O deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) afirmou que o novo regime fiscal vai “incentivar a gastança”. “É um cheque em branco do dinheiro do povo para o governo gastar”, disse.

O líder da oposição, deputado Carlos Jordy (PL-RJ), também criticou a medida. “Antes tínhamos o teto de gastos, agora estamos criando o piso de gastos”, pontuou.

(com Agência Câmara de Notícias)

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