O jornalista norte-americano H. L. Mencken escreveu que para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada. É nesta categoria que se encaixa a iniciativa Dia Livre de Impostos, que acontece nesta quinta-feira (25), organizada pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pela Câmara de Dirigentes Lojistas Jovem (CDL Jovem).
O movimento parte de um problema real e grave: a constatação de que o excesso de tributação e burocracia atrapalha o nosso ambiente de negócios. Compartilhamos o entendimento a respeito do diagnóstico. O problema é que, diante disso, apresenta-se uma solução não apenas ineficaz, como perigosa: a ideia de que é possível viver sem impostos e que a única consequência disso seria termos produtos mais baratos. Isso é falso.
Um dia verdadeiramente livre de impostos, para ser completo, deveria também fechar escolas, hospitais, postos de saúde, tirar polícia e bombeiro das ruas, deixar o lixo espalhado nas calçadas e as ruas sem asfalto, apagar os semáforos e toda a iluminação pública, fechar Procons, Fóruns e equipamentos de assistência social. São os impostos, afinal, que viabilizam a existência do Estado e de toda sua extensa e indispensável rede de serviços.
Ao mostrar só uma parte desse ciclo de tributação e financiamento dos serviços públicos, a iniciativa patrocina uma imagem distorcida que apresenta o Estado como mero empecilho entre consumidores e mercadorias mais acessíveis. Como se a tributação tivesse um fim em si mesma, por capricho ou ganância do Estado.
O momento político pede contribuições maduras e bem elaboradas sobre o sistema tributário nacional. A discussão que acontece no Congresso e no Executivo é ampla e tem sido plural, dando voz a diferentes pontos de vista sobre qual é a reforma tributária ideal. A realização deste irrefletido Dia Livre de Impostos gera ruído e desinformação em um momento de intensa mobilização da inteligência social no debate sobre os impostos.
Temos convicção de que o antídoto para este tipo de pensamento – sedutor, é verdade, mas absolutamente equivocado e perigoso – é a educação fiscal. É fundamental investirmos em iniciativas que difundam a compreensão da função social dos tributos, da qualidade do gasto público e do acompanhamento do retorno dos recursos para a sociedade. Por isso, destacamos a importância da aprovação do PL 1982/2023, que institui o Dia Nacional da Educação Fiscal. É premente a necessidade de trabalharmos o tema da tributação de maneira responsável, fundada no exercício da cidadania, da corresponsabilidade, do fortalecimento do pacto social e da compreensão de que todos temos direitos e também deveres.
Rodrigo Spada, Auditor Fiscal da Receita Estadual de São Paulo e presidente da Febrafite (Associação Nacional das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais). Formado em Engenharia de Produção pela UFScar e em Direito pela Unesp, com MBA em Gestão Empresarial pela FIA.
_______________________
Artigo originalmente publicado na Folha de S. Paulo. Leia no link: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2023/05/o-dia-livre-de-impostos-e-a-solucao-simples-e-errada-para-um-problema-complexo.shtml