O deputado Arthur Maia (DEM-BA), relator da reforma administrativa na comissão especial da Câmara, decidiu prever, além da estabilidade a todos os servidores, redução de 25% da jornada de trabalho para cargos que não sejam considerados típicos de estado.
Ele também estipulou uma indenização a servidores que tiverem o cargo extinto por ter se tornado desnecessário ou obsoleto, assim como a possibilidade de reintegração caso o posto seja recriado em até cinco anos.
Maia leu nesta quarta-feira (1°) o relatório na comissão especial que analisa o mérito do texto. Conforme indicado na terça-feira (31) pelo próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), será concedido vista ao texto, que só deve ser votado no colegiado nos dias 14 e 15 de setembro.
Uma das principais mudanças do relatório, a estabilidade a todos os servidores, já havia sido antecipada por Arthur Maia na terça-feira em coletiva de imprensa. No parecer, o deputado defende que a “estabilidade de servidores públicos, tal como vigora no texto constitucional, constitui mesmo, como defenderam inúmeros palestrantes no debate sobre o tema, um instrumento de defesa em favor dos cidadãos e não em prol dos servidores”.
Segundo ele, o mecanismo “inibe e atrapalha o mau uso dos recursos públicos, na medida em que evita manipulações e serve de obstáculo ao mau comportamento de gestores ainda impregnados da tradição patrimonialista que caracteriza a realidade brasileira.”
Em setembro do ano passado, o governo enviou ao Congresso a PEC da reforma administrativa, que altera as regras no funcionalismo público. Pelo texto, não há efeito sobre os atuais servidores.
O pacote atinge futuros servidores dos três Poderes na União, estados e municípios, mas preserva categorias específicas. Juízes, procuradores, promotores, militares, deputados e senadores serão poupados nas mudanças de regras.
Na reunião, Maia justificou o fato de não ter acatado emenda que buscava incluir outros Poderes na PEC com um parecer da Câmara que teria apontado inconstitucionalidade na medida. Ele, no entanto, decidiu dar a palavra final sobre o tema aos membros da comissão especial na votação que ocorrerá em duas semanas.
O texto relatado por Arthur Maia prevê redução de até 25% da jornada de trabalho para exercício de cargos públicos que não sejam exclusivos de estado, com corte proporcional de remuneração. Há a previsão de o salário ser preservado na hipótese de redução de jornada em decorrência de limitação de saúde ou para cuidar de pais, filhos ou cônjuge que viva às custas do funcionário.
O deputado Rogério Correia (PT-MG) afirmou que o ponto é crítico. “Esse corte de 25% não é só da jornada dos servidores, é também da prestação de serviço”, disse.
“Isso está relacionado com os convênios de cooperação com a iniciativa privada. Eles cortam 25% da carga de prestação de serviço, economizam em cima dos servidores e passam para a iniciativa privada. Essa é a jogada do [ministro da Economia] Paulo Guedes e eles não retiraram isso da emenda constitucional.”
José Nascimento, gerente de causas do Centro de Liderança Pública, defende a medida e afirma que ela é “positiva e interessante”. Esta maleabilidade permite que o serviço público tenha potencial de ganhar em termos de eficiência”, disse. “Maleabilidade também para que o serviço público tenha mais dinheiro para investimentos e gastando menos com a folha de salários.”
O relatório autoriza a contratação temporária, que também não poderá ser aplicada a carreiras típicas de estado. O prazo, incluindo a prorrogação, não poderá superar dez anos. O processo seletivo será simplificado, e não poderá ser firmado novo contrato com o mesmo contratado em menos de dois anos a partir do fim do contrato anterior.
O deputado professor Israel Batista (PV-DF), presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, vê com preocupação a possibilidade de estados e municípios definirem por lei própria quais atividades podem ser temporárias. “Isso é voltado para um ataque especialmente voltado a professores e enfermeiros, eles é que vão ser os mais prejudicados por isso”, disse.
O relator definiu no texto cargos típicos de estado como os voltados a funções de segurança pública, representação diplomática, inteligência de Estado, gestão governamental, advocacia pública, defensoria pública, elaboração orçamentária, ao processo judicial e legislativo, atuação institucional do Ministério Público, manutenção da ordem tributária e financeira ou ao exercício de atividades de regulação, de fiscalização e de controle.
O texto traz algumas vedações a detentores de mandatos eletivos, membros dos tribunais e conselhos de contas, ocupantes de cargos e funções públicas da administração direta e indireta da União, dos estados, municípios e dirigentes de órgãos e entidades.
Eles não poderão ter férias em período superior a 30 dias em um ano, serão proibidos de ter adicionais por tempo de serviço, aumento de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos, licença-prêmio e aposentadoria compulsória como modalidade de punição. Não terão direito também a progressão ou promoção baseadas exclusivamente em tempo de serviço.
Os servidores serão avaliados periodicamente por meio de uma plataforma eletrônica para medir o desempenho individual para o alcance dos resultados institucionais do seu órgão ou entidade. Segundo o relatório, essa avaliação também pode ser usada para promoção ou progressão na carreira, nomeação em cargos em comissão e designação para funções de confiança.
Essa avaliação será feita a cada 12 meses e contará com a participação de usuários dos serviços públicos.
Para o deputado professor Israel Batista, a possibilidade de extinção de cargos por obsolescência com desligamento de servidor, mediante indenização de um mês de salário por cada ano de serviço “é muito ruim, muito perigosa.”
Um dispositivo que estava no substitutivo permitia ao diretor-geral da Polícia Federal indicar o delegado que vai conduzir inquéritos, passando por cima dos superintendentes. “Isso me parece uma concentração de poder muito grande. E não entendemos isso como possível de estar em uma PEC de reforma administrativa”, afirma Batista.
Diante das reclamações, o relator afirmou que o trecho foi incluído por “equívoco”. “Às vezes, na elaboração de um parecer como esse, se cometem alguns equívocos, sobretudo considerando que na hora de entregar, sempre tem uma dificuldade, sempre tem algo a mais”, disse. Segundo ele, o dispositivo estava errado e foi excluído.
O relatório também prevê foro privilegiado para o diretor-geral da PF, o que também gerou críticas de deputados. Segundo Maia, ele foi procurado por um grupo de delegados da instituição preocupados “com a situação de que muitas vezes está havendo interferência indevida dentro da Polícia Federal”. ?
Em 22 de fevereiro, Lira estimou que a reforma administrativa seria votada no plenário da Casa antes do fim do primeiro trimestre. No dia 10 de maio, afirmou que sua intenção era enviar o texto para o Senado até julho.
Depois da comissão, o texto ainda precisa passar pelo plenário da Câmara. Por ser uma PEC, deve receber o apoio de pelo menos 308 deputados em votação em dois turnos. Depois, segue para o Senado, onde precisa de ao menos 49 votos, também em dois turnos.
No entanto, a pressão da base bolsonarista ameaça empurrar a reforma administrativa só para 2023.
Fonte: Folha de São Paulo