Por Rodrigo Spada
Não é fácil tirar esqueletos do armário. Mas, diante de uma reforma, é necessário. É por esse movimento que passamos agora, no momento em que o Planalto e o Congresso estão comprometidos em alterar o sistema tributário brasileiro. Tudo o que foi escondido durante anos nos puxadinhos de legislações opacas e confusas terá de vir à luz para dar espaço a um novo modelo de tributação, mais moderno, eficiente e transparente. É, naturalmente, um caminho complexo e cheio de incompreensões.
Entre os que rejeitam a reforma — por interesse setorial ou desinformação —, ganhou força recentemente um argumento falso, mas aparentemente plausível. Diz-se que a proposta de criação de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) com alíquota estimada em 25% geraria aumento da carga tributária. O caminho que leva a essa conclusão equivocada é o seguinte: se vamos trocar os atuais 5% de ISS ou 18% de ICMS, em média, por 25% de IVA, haverá aumento. Parece fazer sentido, mas não faz —até porque a conta enviesada deixa de fora PIS, Cofins e IPI.
As alíquotas não são comparáveis porque as bases de cálculo são diferentes. Isso acontece porque, ao longo dos anos, em vez de seguir o caminho mais transparente e difícil de aumentar as alíquotas dos impostos, sucessivas legislações foram alterando a base de tributação, concedendo tratamentos diferenciados e reduzindo créditos em manobras que aumentavam a arrecadação de forma oculta, sem o ônus de elevar a alíquota. Além disso, com os impostos incidindo “por dentro” —o tributo incide sobre ele mesmo e não apenas sobre o valor do produto —, paga-se de fato mais imposto do que se vê ao olhar exclusivamente para as alíquotas.
Em verdade, o sistema tributário atual é de tal modo complexo que é impossível saber qual a carga exata de cada produto ou serviço. É por isso que deixou de ser obrigatório colocar nas notas fiscais a informação sobre quanto exatamente foi pago a título de tributos em determinada transação. O máximo que conseguimos é discriminar um valor aproximado do imposto cobrado.
Outro fator fundamental neste debate é a cumulatividade que existe no sistema. Impostos incidem sobre impostos e encarecem o valor final do produto ou serviço. Isso não acontece no modelo de IVA, que retira todo o resíduo tributário da cadeia ao condensar cinco impostos diferentes num só.
O compromisso fundamental da proposta de reforma que se discute é manter a carga tributária no mesmo patamar atual. A alíquota estimada em 25% é fruto de um cálculo que joga luz sobre todos os recônditos do nosso sistema tributário e transforma tudo numa alíquota única, transparente e não cumulativa. Um índice claro, que será um argumento insofismável para que a população cobre retorno dos impostos na medida exata do que se paga.
Rodrigo Spada é Auditor Fiscal da Receita Estadual de São Paulo e presidente da Febrafite (Associação Nacional das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais). Formado em Engenharia de Produção pela UFScar e em Direito pela Unesp, com MBA em Gestão Empresarial pela FIA
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Artigo publicado nas edições impressa e online, em 16/3, do jornal O Globo. Link para assinantes do jornal aqui!